
Luciano Freitas
Titular de vinhos do D.O.M. há 4 anos, Luciano Freitas é uma exceção à regra quando se pensa na trajetória tradicional de sommeliers profissionais. Natural de uma pequena vila no interior do Ceará, ele é o único dos quatro filhos da família que veio a São Paulo para tentar uma vida diferente. Chegou na cidade em 2008 e foi morar na casa do tio, que trabalhava em uma rede de hamburguerias. Começou fazendo bicos em restaurantes no bairro de Santo Amaro, até que apareceu uma vaga de faxineiro em uma dessas hamburguerias. Ficou na função por 8 meses, passou pela cozinha e em seguida conquistou um lugar junto ao time do salão, para trabalhar diretamente com o público.
Foram 3 anos de trabalho na rede, com uma carga horária bastante puxada. Até o dia em que o tio, que era também amigo do Robson, maître do D.O.M., comentou sobre uma vaga de cumim no restaurante de Alex Atala que era “a cara do Luciano, ligeiro e acelerado”. Ele gostou da ideia, mas foi sua mulher, com quem é casado há 15 anos e tem um filho de 7 meses, que deu o empurrão decisivo. “Ia ser um salto na qualidade de vida. Eu trabalharia só de segunda a sexta, no sábado só no jantar e com folga todo domingo. Fui fazer entrevista no dia seguinte”, lembra.
Ele começou no D.O.M. como ajudante de garçom, que é o responsável por tirar a mesa e reorganizar tudo para receber os próximos clientes. E apesar de não ser uma pessoa “de vinho”, passou a prestar atenção no trabalho do time que cuidava dessa parte e da premiada Gabriela Monteleone, então sommelière da casa, ficando cada vez mais interessado pelo métier. “Eu sempre estava perto caso eles pedissem uma garrafa. Gostava de ajudar. E aí acabei decorando todos os rótulos da adega”, afirma.
A determinação e a rapidez de aprendizado do jovem cearense não passaram despercebidos. Um dia Gabriela o chamou de lado, pegou uma taça de vinho branco e perguntou o que ele sentia. Na hora veio o cheiro das lamparinas de sua terra natal, onde não tinha luz elétrica. “Querosene”, respondeu. E ela sorriu: “Acertou em cheio”. E então Luciano começou a aprender mais e mais sobre o universo dos vinhos. Quando Gabriela saiu do D.O.M., ele foi fazer a formação completa da ABS (Associação Brasileira de Sommeliers) e tornou-se oficialmente assistente de sommelier no restaurante, primeiro do João Pichetti, depois da Ivy Suda.
Foi na pandemia que Luciano foi elevado ao cargo de titular de vinhos do restaurante, sendo desde então o responsável pela seleção de rótulos da adega e da harmonização. Ele fala que não mudou o perfil da carta, seguindo o conceito que norteia as escolhas desde a inauguração da casa – busca dar mais espaço a vinhos orgânicos e biodinâmicos, priorizando pequenos produtores brasileiros e internacionais. Como titular, faz uma curadoria a dedo para apresentar aos clientes uma média de 120 rótulos escolhidos de acordo com esses critérios, mas conta que a harmonização segue como primeira opção dos clientes – hoje os menus são servidos com os vinhos pensados por ele para cada prato. “Mas nunca escolho nada sem antes passar pelo chef e pela equipe. Aqui o trabalho é coletivo: todos provam, opinam, um ajuda o outro”, explica.
Hoje com 36 anos, Luciano se lembra de estar deitado em uma rede no alpendre de sua casa no interior do Ceará quando viu Atala pela primeira vez. “Ele apareceu no programa do Luciano Huck ensinando a organizar a cozinha. Gostei muito dele. Gostei tanto que hoje trabalho com ele”, brinca. “Saí do Ceará para a hamburgueria e da hamburgueria pra cá. Minha escola foi o D.O.M.”, acrescenta o sommelier, que hoje está encabeçando um importante projeto: o lançamento de uma linha de seis vinhos de produtores brasileiros, que terão rótulos desenhados por grafiteiros e contarão a história de cada um desses produtores, como parte da comemoração aos 25 anos do restaurante.